Eu sou você amanhã: "Cuidado, menina!"
[...] E eu me lembro da minha mãe dizendo: Cuidado, menina!
Eu fingia que não escutava, me ria e pensava que mamãe precisava se dar mais pra essa vida, precisava afrouxar as suas amarras. Pensava que ela queria estar vivendo essas minhas noites sem fim, e por isso me repreendia tanto.
Mamãe dizia: Cuidado, menina! E eu me ria.
Hoje eu entendo.
Hoje eu me rio de fraqueza ao me olhar no espelho; de raiva quando vejo aquele reflexo opaco do outro lado, que me ri de volta, ironicamente. Eu envelheci dobrado, somando todas as noites que teimei em não escutar minha mãe. Passou algumas décadas, e boa parte de mim se perdeu na poeira das tortuosas ruas que andei, rindo e cantando com os companheiros de mesa de bar, encondendo na fumaça os erros que tentava fazer se esvair.
"Cuidado, menina!"
Hoje eu sei do que ela falava.
Ela não falava do álcool, da nicotina, do sexo, dos amores perdidos.
Ela falava dos meus excessos. Daquela minha pressa desmedida de viver. Ela sentia em mim o cheiro da bebida, do cigarro, dos quartos escuros; ela via o sorriso sereno se perder entre uma noite e outra, já rememorando um novo velho amor.
O grande problema não era isso, mas perceber isso em mim todos os dias.
Minha pouca saúde que resta, me obriga a continuar respirando e continuar lembrando da voz forte da minha mãe dizendo: "Cuidado, menina!".
Eu passo o dia inteiro nesse saudosismo enfadonho e doloroso, até que a noite cai. Eu me visto, saio do apartamento no terceiro andar, paro na mercearia do lado do prédio, compro um vermelhinho, sento na mesa da esquina, e peço uma: "Não tão gelada, heim!".
Eu sento sozinha, entre burburinhos conhecidos e gargalhadas já vividas, e escuto minha mãe, que diz: "Cuidado, menina! Olha a tua saúde". Dessa vez eu me rio desafiadora, como se aquela áurea me trouxesse a velha mania de revidar, de se atrever, e solto baixinho: "Ora, mamãe... Nascer acabou com a minha saúde".
Memórias de Sabina.
Eu fingia que não escutava, me ria e pensava que mamãe precisava se dar mais pra essa vida, precisava afrouxar as suas amarras. Pensava que ela queria estar vivendo essas minhas noites sem fim, e por isso me repreendia tanto.
Mamãe dizia: Cuidado, menina! E eu me ria.
Hoje eu entendo.
Hoje eu me rio de fraqueza ao me olhar no espelho; de raiva quando vejo aquele reflexo opaco do outro lado, que me ri de volta, ironicamente. Eu envelheci dobrado, somando todas as noites que teimei em não escutar minha mãe. Passou algumas décadas, e boa parte de mim se perdeu na poeira das tortuosas ruas que andei, rindo e cantando com os companheiros de mesa de bar, encondendo na fumaça os erros que tentava fazer se esvair.
"Cuidado, menina!"
Hoje eu sei do que ela falava.
Ela não falava do álcool, da nicotina, do sexo, dos amores perdidos.
Ela falava dos meus excessos. Daquela minha pressa desmedida de viver. Ela sentia em mim o cheiro da bebida, do cigarro, dos quartos escuros; ela via o sorriso sereno se perder entre uma noite e outra, já rememorando um novo velho amor.
O grande problema não era isso, mas perceber isso em mim todos os dias.
Minha pouca saúde que resta, me obriga a continuar respirando e continuar lembrando da voz forte da minha mãe dizendo: "Cuidado, menina!".
Eu passo o dia inteiro nesse saudosismo enfadonho e doloroso, até que a noite cai. Eu me visto, saio do apartamento no terceiro andar, paro na mercearia do lado do prédio, compro um vermelhinho, sento na mesa da esquina, e peço uma: "Não tão gelada, heim!".
Eu sento sozinha, entre burburinhos conhecidos e gargalhadas já vividas, e escuto minha mãe, que diz: "Cuidado, menina! Olha a tua saúde". Dessa vez eu me rio desafiadora, como se aquela áurea me trouxesse a velha mania de revidar, de se atrever, e solto baixinho: "Ora, mamãe... Nascer acabou com a minha saúde".
Memórias de Sabina.
Comentários
adorei joaninha, esse negocio de nascer realmente acaba com nossa saúde, que na eternidade da inexistência era tão plena.
Acho que estamos nascendo e morrendo a cada etapa de nossa vida.. o que nos resta? viver,sempre.
ehhehe