domingo, 6 de julho de 2025

Das dunas fiz um porto.

Diante de ti

tremo e tenho tudo

e remo tanto 

para não falar

que minha rima

fraca e cansada

de repouso e 

de descanço

de um trabalhador da palavra

só pensa em ti.


Dias sim, dias não

a praia nos falta toda hora.


Pôr do sol 

nascer do sol

aonde podemos

livres andar com sono de manhã

sem chão

sem cão

latido

boçejo

e bôto. 

Te durmo

ao amar-te tão cedo

amo a bunda

da baiana

da umbanda

e do sossego


Amo-te amanhã

ontem e sempre.  


terça-feira, 1 de julho de 2025

O poeta está vivo?

Não! A palavra que me falta 

É a voz que desacontece 

E o poeta mudo 

escuta o vazio do som. 

 

O som que me acontece 

É no silêncio que emburrece 

E no vazio do escuro do poema

falta a voz da letra.  


Venha então vindo 

A toada vazia do vêludo 

E que o vagalume da vida 

te assuste ao piscar. 

 

E quem ver em sua

luz sua sina 

pode iluminar 

suas sentenças 

domingo, 15 de junho de 2025

Problemas dissesses!

Naquele tempo

parece que eu

vazio

nunca tinha escrito

nada p'ra ti.

E, por tantos anos 

procurei lá

o todo dia do amor.

Parecia que eu barroava sem nem ver

as vias do teu corpo.

E enquanto tu dormia

eu estava lá pensando em ti.

E escrevendo essas linhas

que te obrigo a ler

digo pois 

estarei aqui 

meu amor

te esperando aflito. 

sexta-feira, 6 de junho de 2025

Bar da esquina

Não, não tem mais jeito

Melhor é dizer adeus

Você com sua crença

Sua presença e ostentação

Seu chopp escuro, bem reservado

Nos bares sofisticados

Com sua discriminação


Já eu sou madrugada, é tudo

E nada, é flor e espinho

Sou mais uma cerveja

No bar da esquina

Com meus amigos


Prefiro meu pagode

Pulsando forte

Bem lá no Fundo do Quintal

Eu gosto é de sentir a poesia

Mas em sua companhia

Só no outro carnaval


Aragão, Jorge. 

quinta-feira, 13 de março de 2025

Carta a Josefa, minha avó:

    Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo — e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira — sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.

    Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com  isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos de rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. Para ti, a palavra Vietname é apenas um som bárbaro que não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio. Da fome sabes alguma coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja.(Contaste-mo tu, ou terei sonhado que o contavas?

    Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém. Estou diante de ti, e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha-vã e chão de barro. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos — e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Por que foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto talvez entenda eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesse escolher das minhas inumeráveis palavras as que tu pudesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti — e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava. Não teremos, realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas — e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, por que te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: "O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!"

É isto que eu não entendo — mas a culpa não é tua.’

José Saramago

sábado, 15 de fevereiro de 2025

O poeta de ontem

Ontem alertado pela minha mulher

reconheci o poeta:

estava um clima romântico. 

Ela chamava ele de meu amor. 

Certo tempo, rápido e depois que o cumprimentei 

ele virou de lado 

esqueceu a praça

e o parça de letras

que estava lá

e foi-se.

Coordenador agora de tempos.

Eu fiquei com meu aconchego

e mais uma cerveja.

Até amanha, se houver carnaval. 



Das dunas fiz um porto.

Diante de ti tremo e tenho tudo e remo tanto  para não falar que minha rima fraca e cansada de repouso e  de descanço de um trabalhador da p...